Zambi, Ana / Escritor
Os poemas de Ana Zambi queimam: como a verdade prática ou a brasa do cigarro. Tanto fado: verdade, destino, quanto fardo: peso e responsabilidade dessa mesma verdade e destino carregar o signo do rigor das palavras/é fado e fardo/não se transmite.
Astróloga e poeta, Ana Zambi surge com o belo as 12 voltas de júpiter e a mira de saturno, um primeiro livro que reflete os ciclos da experiência. Ciente dos desastres e augúrios que esses ciclos podem causar, esta poesia pendula entre o trauma e a beleza, tentando tirar do cotidiano aquilo que os ingleses chamariam de silver lining, ou seja, o revestimento prateado de toda situação tempestuosa.
A expressão significa tudo tem um lado bom, o que poderia ter laços bem apertados com o sentido jupiteriano do otimismo: mas se engana quem acredita que os poemas de Zambi caem no otimismo inocente ou no dualismo estanque. Com o lirismo temperado de ironia, devedor de Alexandre ONeill, citado nas epígrafes do livro, esta poesia também elabora com escárnio a reação a uma realidade comezinha e mundana demais.
Quanto a ela, o maior tributo a se pagar com a moeda do tempo de Caronte é listar as coisas escritas com fúria: olhos fechados de desejo/tentativas de esquecer o frio/a cama dura que nos fere as costas/as minhas costas feridas e o modo como as dei ao mundo.
Sem querer dar spoiler, as 12 voltas
falam de como se voltar mais uma vez para esse mundo, se reconectar com ele, a partir do básico: dos seus elementos naturais, da escrita vertiginosa dessa realidade, do desejo por um corpo permanentemente em falta.
Quem está sob a mira destes poemas é o leitor, ele é o interlocutor final dessa voz que se dirige ao ser amado, aos luminares, às métricas do céu. Que ele se permita ser flechado.
Fernanda Drummond